Précis de Décomposition

1338Précis de Décomposition, publicado em 1949 pela editora Gallimard, é um divisor de águas no conjunto da obra de Cioran: livro que inaugura sua fase francesa, marca a “conversão” linguística efetuada pelo autor ao abandonar o idioma nativo e adotar o francês como língua de escrita. É a partir do Précis que o filósofo romeno passará a assinar E.M. Cioran (iniciais inspiradas no escritor britânico E. M. Forster (vale lembrar que a letra “M” do meio não corresponde a nenhum nome do meio, como amiúde se supõe: “Mihai”, “Michel”, etc.)

exercices-negatifsAntes de ser intitulado Précis de Décomposition, o livro teve outro título provisório: Exercices Négatifs (“Exercícios Negativos”). Os rascunhos e esboços do texto final (sua versão inacabada) acabariam sendo publicados postumamente na França, no mesmo ano de sua morte, com o título de Exercises Négatifs: En Marge du Précis de Décomposition (Gallimard/Les inedits de Doucet, 2005). É interessante saber que Cioran reescreveu integralmente o livro quatro vezes, motivado pelo comentário de um amigo a quem pediu a opinião sobre o seu desempenho no novo idioma: Ça fait méteque (“soa meteco/estrangeiro”), foi a resposta nada animadora.

Ainda em 1947, Cioran envia os manuscritos do Breviário para a Gallimard, que decide publicá-lo. Contudo, por motivos diversos, a publicação é adiada inúmeras vezes, vindo a acontecer somente dois anos depois, com uma tiragem modesta de apenas dois mil exemplares. Ainda que não seja um sucesso de vendas, o livro é muito bem acolhido pela crítica, recebendo menções bastante favoráveis em diversos jornais. O primeiro de todos os artigos sobre Cioran na imprensa francesa, a propósito da publicação do Breviário, é de Maurice Nadeau, no jornal da resistência, o Combat (29 de setembro de 1949), em que o jornalista saúda Cioran como um “pensador crepuscular”:

[…] aquele cuja chegada foi preparada por todos os filósofos do vazio e do absurdo, o arauto das más novas por excelência. Saudemo-lo e observemo-lo de perto: ele dará testemunho de nossa época” (Maurice Nadeau, “Un penseur Crépusculaire”, in: Le Combat, 29 de setembro de 1949).

Breviário lhe rendeu também elogios no L’Ópera (14 de dezembro de 1949) e no Table Ronde (janeiro de 1950). No primeiro, o jornalista André Maurois se refere a Cioran como “o novo moralista ou imoralista”, e, no segundo, Claude Mauriac o saúda como o detentor de uma linguagem magistral: “Eis aí o tom e a língua de um mestre! Todas as proporções guardadas, nós estamos mais próximos de Pascal do que de Vigny”. Até então um perfeito desconhecido em Paris, Cioran escreve para a sua família em 9 de outubro de 1949, contente: “Fui finalmente admitido nos meios parisienses mais interessantes, grandes escritores, etc… eu lhes enviei o livro, não sei se receberam. Até agora, a crítica tem-me sido extremamente favorável […] enviarei um artigo publicado em um dos maiores jornais daqui, com minha foto”.

Em 1950, Cioran é agraciado pelo Précis com seu primeiro prêmio literário, o único que aceitaria em toda a sua vida (muitos outros viriam a ser oferecidos; todos recusados): trata-se do Prêmio Rivarol para escritores estrangeiros, no qual se encontra, entre os jurados, o escritor André Gide.

Breviário foi o segundo livro de Cioran a ser publicado no Brasil, em 1989, pela Rocco, com primorosa tradução do filósofo e professor (PUC-RJ) José Thomaz Brum, (o primeiro foi Exercícios de Admiração). Infelizmente, é um dos poucos títulos de Cioran publicados no Brasil até o momento, além dos Silogismos da AmarguraHistória e UtopiaExercícios de Admiração e Antologia do Retrato: de Saint-Simon a Tocqueville (sendo este não um texto do próprio autor, mas uma coletânea de perfis literários, por ele organizada, de figuras ilustres da França dos séculos XVIII e XIX).